sábado, dezembro 29, 2007

Fecho

Sou eu quem tem de fechar este livro que começaste
Quando em ti havia o alegre querer de fazer comigo
– não tudo
Não podia ser tudo.
Mas quase tudo, acredito e acreditaste
Se impregnava da alegria do que havia entre nós.
Isso acabou. É a natureza das coisas. Eu, quando acabar,
Quero ser cinzas. Mas que cinzas
Pode um blog deixar?

E lerás algum dia isto? Ou cinzas são o olvido
De um grito nunca lido
Nas entranhas de um computador?


291207-0213

Últimas

Há cartas que custa meter no correio
Há palavras que custaram ser ditas
Rujo surdo numa dor que não quis conhecer
Não secam as lágrimas não

Há mesmo morte e não acreditei
E agora a minha anunciada enche-me de pavor
E teres pena de mim... que desaforo, que não mereço
A lutar sem armas pelo teu amor
Que não se reacenderá

Rujo surdo e choro na rua
É do frio já se sabe
Ou então mais um velho que chora

Não está lá ninguém – nem bato à porta
Dos tais fieis amigos que há sempre nesta altura
Morrer é sozinho e ninguém conta como foi

E está tudo certo assim é que é
O tempo certo mas sempre curto
Não sabia nada até agora
E o que sei tem por trás canções que me fingiram
Quando ainda até canções havia

Mesmo a lua que foi cheia para nós está doente
Deitada torta à espera de se sumir
Fantasias, imagens como outras

Doce olhas para mim e o beijo nos lábios
É adeus garantido uma vez mais
Eu devia fugir e não sei para onde
Perdido no meu espaço exacto e tão útil

Só partir é a resposta mas não há sítio
Quando quem partiu foste tu que era a altura
Exílio agora é mesmo substantivo
E não mudança de estado

Que farto estou dos lugares-comuns que fazem o choro
Que farto estou de ser friável e não granítico
Que pena tenho que a última oportunidade
De ser o homem que sonhei se desfaça
Nesta poeira talvez bíblica
Ao menos essa consolação – já o disseram
Sou pó e em pó me tornarei

Amigos meus tiveram doenças solenes
Corações que pararam e que por sorte
Alguém reanimou. Passaram eles
Por este estalar insuportável? Dizem que não
Que de repente desmaiaram... Então
Serei eu um dos tais a quem nem esse dom é dado?
Que de um coração quebrado sem esperança de emenda
Tenha que viver com os restos desacertados?

Eu jurei que nunca faríamos mal um ao outro, e jurei
Não és tu quem me faz mal
Sou eu que deste mal fiz tragédia
Não sei continuar
Ruje surda uma dor que nunca tive
Eu que nunca passei fome
Nem guerra
Nem perseguição




301107-0350
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